terça-feira, 31 de agosto de 2010

Meio assim, sei lá...



A simplicidade me falta, minhas mãos estão atadas. Meus olhos se encharcam, a inspiração se esmorece. Tento entrelaçar-me no silêncio que propaga. Sonetos de saudades são entoados, enquanto meu peito se contrai e se aquieta. A memória me falta, e o calor me penetra impetuosamente num abraço não perceptível. A respiração encaminha meus dedos que mal sabem onde tocar. Um andar alienado se interrompe, pois os pés levemente surrados se fatigam. Banalidade me é cobertura ao mesmo tempo em que meu equilíbrio acena, fechando a porta. A busca contínua por um porquê se finda sem um desfecho admissível. Tantas perguntas, poucas respostas. Tantas poesias... compreendidas? Minha sanidade desperta em meio a metáforas, e compreensão não há. Sou poeta do insolúvel, trovador do enigmático. Frases desconexas me são um ponto de coerência no instante em que o calor me desampara. Minhas cantigas não se ajustam a um ser comum, minhas composições não têm teor “reflexão”. A dura descrição simbólica de um Filósofo incrédulo! Criatura singular em um universo estagnado. Nada sei sobre o amor, e sim, saudade. A ausência do incógnito fiel que garantiu-me um Olá. Penso, sinto, vejo, adormeço, amanheço, escrevo meio assim, sei lá. Decifrar-me? Improvável. Aliás, mal sabes que descrevi-me suntuosamente no ontem. Desmembrei-me poeticamente no Hoje. A adiantei-me nostalgicamente para o amanhã.
“Suponho que me entender não é uma questão de inteligência e sim de sentir, de entrar em contato...” (Lispector)

Descanse em Paz




Um instante e uma canção. Uma lágrima e uma recordação. Os poetas nos ensinam o dever de doação incondicional. Os poetas nos ensinam que não há o amanhã e que amar é preciso. Uma perda, uma dor. Um passado, um presente... um futuro? Peço licença ao meu sadismo e frieza, e me coloco a sentir, a sofrer. Nem que seja até o sono me envolver, mas eu quero e preciso lamentar, esbravejar... chorar. Uma falta de ar e olhos embaçados. Eu faço o respeitoso minuto de silêncio, minha respiração ofegante é o máximo que ouço e aos poucos o High and Dry de Radiohead se esvai. A saudade do que eu não mais verei é angústia... é tortura. Visito o quarto ao lado de minuto em minuto, vejo a mulher da minha vida. Que já dorme inconsolada com uma expressão moída na face. Chego perto, eu preciso sentir sua respiração, é minha única fonte de alívio nesta calorosa madrugada fria. Uma amiga que ainda se vai .. uma amargura que não foi inteiramente sentida, vivida. Ainda há muito pela frente... Que a morte não perpetue sobre nosso telhado, não agora, não nunca. Entre tudo, essa sensação de fraqueza é o que me destrói. Sim, eu preciso de forças. Força para amá-los no hoje. A vida eterna tão negligenciada por mim é o paradoxo que me abranda. Que venha o amanhã, que venha a lembrança coberta por um riso. Uma falta deleitosa de se sentir. Que o dia amanheça e que o tédio se faça presente. Não preciso do surpreendente até que meus olhos se sequem e mirrem. Que o amanhã respeite o meu sofrer, meu Luto.

Texto dedicado à Vera Mattos. Uma Grande mulher que cumpriu sua missão e foi em busca do que acreditou durante toda sua vida.